'Dizem que finjo ou minto
Tudo o que escrevo. Não.
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação.
Não uso o coração.
Tudo o que sonho ou passo,
Tudo o que me falha ou finda,
É como que um terraço
Sobre outra coisa ainda.
Essa coisa é que é linda.
Por isso escrevo em meio
Do que não está ao pé,
Livre do meu enleio,
Sério do que não é.
Sentir? Sinta quem lê!'
Fernando Pessoa
Na primeira estrofe, o poeta apresenta a sua tese: não usa o coração para escrever, sente com a imaginação e não mente.
Na segunda estrofe, Pessoa desenvolve e fundamenta, filosoficamente, a necessidade de usar a imaginação para escrever: o poeta pretende ultrapassar "o que lhe falha ou finda" e "contemplar outra coisa", que são como "um terraço/sobre outra coisa", sendo "essa coisa "é que é linda". "Essa coisa" dão os dados da imaginação, a transformação artística operada pela inteligência / imaginação. A comparação "como que um terraço" simboliza as aparências que escondem a realidade mais bela.
Na terceira estrofe, o poeta justifica o facto de se querer libertar do imediato e das sensações, em que ao escrever se distancia delas, colocando-se ao nível do fingimento, do pensamento e livre da confusão dos sentidos, acreditando sincero na esfera daquilo que não é o que parece. No último verso, termina ironicamente, remetendo o sentimento e as emoções para o leitor, para que ele sinta a "dor lida".
Nota:
- o poema é constituído por três quintilhas;
- linguagem simples, poesia com ritmo e musicalidade;
- uso da metáfora "Sinto com a imaginação";
- uso da ironia "Sentir? Sinta quem lê!".
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